Conexão Mulher
DestaqueSaúde e Bem-estar

Sem Ozempic no SUS: por que não há remédio para obesidade na saúde pública

O Brasil tem seis medicamentos contra a obesidade aprovados pela Anvisa: a sibutramina, o orlistate, a associação de bupropiona e naltrexona, a liraglutida, a semaglutida e a tirzepatida. No entanto, nenhum é oferecido pelo SUS.

O que aconteceu
Comissão negou inclusão de medicamentos no SUS. Na decisão mais recente, de agosto de 2025, a Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS) optou por não incluir remédios à base de semaglutida (Ozempic e Wegovy) e liraglutida (Saxenda e Victoza) no sistema, sob a justificativa de alto custo.

Custo seria bilionário. Os medicamentos a base de liraglutida e semaglutida são do laboratório dinamarquês Novo Nordisk e são comercializadas pelas farmácias a partir de R$ 963, a depender do medicamento, dose e onde é comprada, e pode chegar a R$ 1.799. Segundo relatório do Ministério da Saúde, o custo dos medicamentos para a saúde pública seria de R$ 6,4  bilhões (semaglutida) e R$ 9,8 bilhões (liraglutida).

Ministério da Saúde afirma que decisões da Conitec abrangem diferentes frentes, entre elas a de custo-efetividade. “No caso da liraglutida e da semaglutida, o impacto financeiro estimado é da ordem de R$ 8 bilhões anuais. Esse valor representa quase o dobro do orçamento do Farmácia Popular em 2025”, afirmou a pasta em nota a VivaBem.

SUS oferece alternativas contra a obesidade que incluem mudanças de hábito. Hoje, o sistema público disponibiliza abordagens como orientação alimentar, incentivo à atividade física e apoio psicológico, além de cirurgia bariátrica em casos específicos. Não há oferta de medicamentos contra a obesidade.

Custos da obesidade também não são baixos. Um estudo apresentado pela SBEM (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia) e realizado pela Unifesp apontou que, entre 2021 e 2030, os custos diretos ao SUS com doenças associadas à obesidade podem atingir US$ 1,8 bilhão (R$ 10 bilhões). As perdas indiretas, como anos de vida produtiva, podem chegar a US$ 20 bilhões (R$ 110 bilhões).

Não foi a primeira vez que a Conitec rejeitou incorporar medicamentos contra a obesidade no SUS. Segundo a SBEM, nos últimos cinco anos, além das canetas, outros dois medicamentos foram negados: orlistate e sibutramina, também pelo custo. Mas, segundo a SBEM, a sibutramina teria um custo mensal menor que R$ 30 por paciente. A pasta não justificou porque ela, mesmo mais barata, não é oferecida no SUS.

Sociedades médicas criticam o posicionamento

Sociedades médicas divulgaram uma nota. Ainda em agosto, a SBEM divulgou uma nota conjunta com a Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica) e a SBD (Sociedade Brasileira de Diabetes) criticando o posicionamento da Conitec. Elas alegam que a decisão vai contra ao princípio de universalidade do SUS.

Nós, profissionais de saúde, vemos os pacientes que pioram a cada dia e assistem à elitização do acesso ao tratamento medicamentoso da obesidade. (…) A indisponibilidade no sistema público fere os beneméritos princípios de equidade, universalidade e integralidade do SUS.
SBEM, Abeso e SBD, em nota conjunta

Decisão não é compreendida pelos médicos. Clayton Macedo, diretor da SBEM, afirma que não faz sentido a obesidade ser a única doença crônica sem cobertura medicamentosa pelo SUS, já que está associada a pelo menos outras 200 condições e é multifatorial. Ele entende que hoje o custo é alto, principalmente no que diz respeito às canetas emagrecedoras, mas que a relação custo-benefício não é mensurada.

Não é apenas tratar o excesso de peso, mas prevenir e tratar as complicações desse excesso de peso. Isso impacta muito o custo da saúde pública: tratar hipertensão, diabetes, desfechos como AVC e infarto, artrose e colocação de prótese no joelho ou quadril. Não tem dados expressivos desse impacto a longo prazo.
Clayton Macedo, diretor da SBEM

SBEM acredita que gasto com medicamentos para obesidade seria um investimento a médio e longo prazo. “Se a gente olhar o preço da medicação na ponta do lápis, é uma medicação cara. Mas os gestores de saúde precisam entender que a qualidade de vida das pessoas que convivem com obesidade é um investimento a médio, longo prazo. Fora o benefício individual, o benefício coletivo, em relação à parte econômica, é bastante ponderável”, destaca Macedo.

Nova campanha da SBEM quer pressionar por políticas públicas. A SBEM lançou, nesta semana, a campanha “Tratamento da Obesidade: Acesso Já”, com o objetivo de sensibilizar autoridades e pressionar por políticas públicas no tema. A sociedade prevê petição pública, mobilização digital, produção de vídeos educativos, articulação política e jurídica junto ao Ministério da Saúde, Conitec, MPF e Conselho Nacional de Saúde, entre outras medidas. Pelo menos outras quatro entidades apoiam o movimento.

Tendência é que custos das medicações caiam com tempo, o que é consenso entre Ministério e SBEM. “A médio prazo, como outros medicamentos vão entrar, a partir da quebra da patente, o custo provavelmente vai diminuir”, diz o médico. A entrada de genéricos no mercado garantem preços 30% a 40% mais baixos, completa a pasta, e fortalece as condições para incorporação da tecnologia ao SUS.

Camila Corsini – De VivaBem, em São Paulo

Imagem: Getty Images

Notícias relacionadas

Golpistas se Passam por Bombeiros para Exigir Pagamentos Indevidos

Rosana Schultz

Anvisa suspende comercialização de produtos por irregularidades

Rosana Schultz

Doença Falciforme passa a ser de notificação compulsória em todo o país

Rosana Schultz